domingo, 18 de janeiro de 2009

Nota de desagravo aos que se levantam e caem apenas por culpa alheia


Desprezo as pessoas que vivem em ondas, que sobem para descer e descem para tornar a subir.Não me encanta essa linha sazonal, de maré cheia e maré baixa. Repetindo os mesmos erros e se deixando levar pelo empuxo. Agora sofrem como coitados, às mínguas, colhendo esmolas dos amigos. Perguntam-se por deus ou pelo diabo, querem fazer contratos, pagar pedágios, abrir o mar com a palma das mãos. Daqui a pouco já não importa. Algo acontece e os levanta para a crista da onda. São sóis e sorrisos, são deuses sem olhos. Sentem o futuro como um abrigo e o presente como a vontade. Mas nunca param para pensar que não foram eles que se levantaram por própria conta. Precisam de bengalas. Por isso, logojá não há mais nada, e caem outra vez, como areia que a maré traz.
Desprezo as pessoas sem o dom da constância, que é a força de um atol, de um recife de corais. Perdendo a pele e as pedras para o mar, mas criando eu seu lugar a vida, nova vida no velho esqueleto. Desprezo os que só são constantes no ciclo sem fim da deriva. Aqueles que estão sempre nômades, mas andando em círculos. Acham que mudam, acham que diferem, acham que cada dia é outro. Mas não. Voltam a cair nas mesmas intempéries, voltam a sentir o mesmo rigor. Sem ver que foi a falta da luta que causou a derrota. E eu, que luto tanto para dar um passo, em meio a toda essa água, acabo no chão, de volta ao compasso, com os punhos sujo da mesma areia. Desprezo profundamente aqueles que, como eu, só descem na maré baixa e só sobem na cheia.

2 comentários:

  1. Nossa Zé, esse texto me atingiu profundamente. =/

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  2. Deixa um desconforto, né?
    Só que é mais que isso. O que no começo parece ser a crítica do outro, cresce e vira constatação do eu. Sóbrio e profundo.
    Textos sempre mto bons!

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pode falar, eu não estou ouvindo