segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Eloá




Todo mundo está falando sobre Eloá. Todo mundo falava sobre Nardoni. Agora ninguém mais fala. Na tv, no rádio, nos jornais... tudo esmiuçado, destrinchado, repetido numa sucessão vertiginosa de fatos. A menina perdeu até o sobrenome. Agora é só Eloá. É íntima dos lares brasileiros, podia ser vizinha de qualquer um, uma filha, uma prima. Não é mais preciso dizer com todo o jargão jornalístico: Eloá Fulana, tantos anos, moradora de sei lá onde.
É sabido cientificamente que nossos narizes se acostumam com um cheiro pelo excesso de exposição. Se você por acaso vai morar numa peixaria, o cheiro de peixe te incomodará por um bom tempo. Mas, depois, você se torna imune a ele, e deixa de senti-lo. Seu olfato fica saturado.


A mídia nos satura de informações sobre determinado acontecimento. Chamam-no de “caso”. O caso Eloá, o caso Nardoni, etc. Gastam tempo, horário e dinheiro destrinchando cada detalhe, transformando tudo em uma novela. E nós nos tornamos imunes. Depois de um tempo, a exposição é tanta que não lembramos mais de nada. É como se esgotássemos o assunto de uma forma tão definitiva que, passado um instante, já nos esquecemos. Logo surge outro “caso” e outro e outro e outro e outro.
O problema dessa atuação da imprensa é que ela impede o discernimento. Aproveita o calor do acontecimento para um bombardeio tão cansativo de detalhes que, quando a poeira baixa, não nos damos a chance de pensar a respeito. O público tem chance apenas de ficar colerizado, de rogar pragas, se indignar e pronto. Não há momento para reflexão. Ponto negativo para a mídia brasileira e sua concepção pré-histórica de utilidade.
Ponto negativo para nós, o público. Por chamarmos a Eloá de Eloá e não de Eloá Fulana, de tantos anos, nascida sabe-se lá onde. Por chamarmos o acontecimento de “ Caso Eloá”, como se fosse um seriado americano. Nós brasileiros e nossa grande capacidade de nos tornar íntimos sem laços verdadeiros. O fato é terrível sim, com certeza. Mas nós não somos a mãe de Eloá para nos indignarmos e nos encolerizarmos. Não temos esse dever. Nosso dever é olhar de fora e enxergar os erros. O que aconteceu não foi uma novela, cujo intuito é fazer com que o telespectador se identifique com as personagens. Não são personagens, nós não temos que sofrer com eles, torcer por eles, criar expectativas por eles. São seres humanos. E a nós, como seres humanos, cabe o difícil dever de observar, aprender e voltar o exemplo deles para nós mesmos.
Basta de assistir a realidade como uma novela de segunda.


2 comentários:

  1. Oi zé!!Como havia lhe prometido estou aqui viu??Nunca me imunisei para assusntos tão sérios como esse!!E fico feliz em saber que existem mais pessoas que se sentem também indignadas com essas "novelas",como você bem disse,criadas pela mídia!!Mais um texto perfeito(como sempre)!!Uma semana azul com muita inspiração pra você!!Se cuida!!bjus

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  2. Zé, também me irrita esse sentimento de intimidade e o compadecimento por uma dor tão alheia. É claro que é ruim, mas você disse muito bem, não é nossa vizinha, nossa filha..
    Lembra de em quantos orkuts aparecem fotos e vídeos da Isabela Nardoni? Cada vez que via um achava tão mesquinho, tipo "esse povo não tá nem aí", é uma pena instantânea, efêmera.
    Pura banalização; assim como eu percebo a banalização do amor. Já viu como as pessoas facilmente dizem "eu te amo"? Eu hein, pra mim as coisas não são assim não, o buraco é beeeeeeeeem mais embaixo.. kkkkkkk
    Mas isso é assunto pra outro post.. você me deu uma idéia, talvez eu escreva sobre!

    texto maaaaaaaaaaara!!
    ;***

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pode falar, eu não estou ouvindo