Com ela sempre havia a possibilidade de chuva. Era encontrá-la e pressentir com um arrepio o céu nublado, fosse o sol que fosse, e a secura que houvesse, mas com ela sempre havia o meio da tarde cinza.Talvez por isso os dias pesassem longos e oblíquos – aquela moça tinha um espírito líquido. Pingos sobre as barras de ferro do portão, o chão escuro do quintal e as nuvens que espiavam por trás dos muros. Nada permitia que eu me levantasse da cama, e a moça dormia sobre o meu braço como uma lagoa macia. Ela não tinha nada de mar, nada de oceano: era toda rio, fluvial, doce. Os sorrisos como libélulas, as costas chãs como pedras de riacho e as pernas... Ah, as pernas... Pareciam seixos, espelhos, botos. Era a correnteza das pernas que me enroscava, antes com violência, agora com mansidão morna, com tristeza. E ao meu redor, por todo o meu corpo e por todo o leito branco, a cachoeira negra de seus cabelos.
( goiânia, 13 de setembro de 2007)
Como eu já disse, olha aí, vc ainda sabe escrever.
ResponderExcluirEu gostei dessa. Nem que seja apenas porque você sabe empregar a palavra "chã" sem conotações churrasqueiras.
ResponderExcluirMeu comentário matou a poesia do momento, infelizmente...
Aqui vai uma palavra que a tempos eu não dizia:
ResponderExcluirwow!
Cara, vc me fez sorrir sozinho, marear os olhos e me lembrar de mil coisas.
"fluvial"