Eu sentia que havia algo de transcendente nos programas dominicais de auditório. Todas aquelas mulheres semi-nuas rebolando, os jogos de cartas e as competições escolares, aqueles comediantes chinfrins tendo orgasmos de felicidade, os apresentadores sorridentes, a platéia animada... tinha que ter alguma coisa filosófica naquilo tudo e só eu ainda não era capaz de perceber. Mas a verdade, meus amigos, veio desabar sobre minha cabeça como um piano de desenho animado. Caiu estrondosa em uma tarde de domingo, às vistas do Domingo Legal e do novo programa da Record: Era claro! Claro como uma islandesa anti-social! Tudo não passava de uma metáfora!
Não há no universo inteiro analogia mais perfeita que a do Programa Dominical de Auditório e a mente do brasileiro. Nada simula com maior precisão o que se passa na parte escura dos meus compatriotas que um auditório bregamente decorado, um apresentador de terno e dezenas de pessoas semi-famosas enfileiradas diante da câmera, dançando o tempo todo e participando de gincanas que envolvem dinheiro, casa própria ou jatinhos de água. É a metáfora perfeita.
As atrações oscilam entre dois pólos: o apelo incessante pelo instinto ou a demanda irritante pelo sentimentalismo. Da mesma forma, o brasileiro médio (sim, estou generalizando. Não, não vou me desculpar) imagina que o bom da vida é tudo que atenda ao instinto imediato – mulheres, cerveja, comida, futebol – e também tem certeza de que bondade e altruísmo é se emocionar quando gente pobre ganha um alisamento de cabelo ou revê o pai bêbado que não via há dez anos.
Tenho pensado muito em como nós temos a tendência de reduzir as possibilidades mentais a um conjunto de quatro ou cinco pensamentos. Não dá para esclarecer bem o que eu quero dizer num blog, mas a idéia seria a seguinte: de tantas coisas que acontecem e que existem para serem pensadas, as pessoas vão escolhendo naturalmente uma ou outra que mais lhes interessa, ou que sejam mais fáceis, e descartando as demais. Essa peneiração não parece, entretanto, ser consciente, mas ao léu, a deriva. E terminamos pois, com nossa mente aos moldes da programação da tv aberta em dia de domingo: futebol, música religiosa, futebol, mulheres de biquíni, futebol e mulheres de biquíni em banheiras. Até que a segunda chegue e nos preocupe de novo com ganhar dinheiro e trabalhar. Mas, além disso, há muito pouco universo.
Acho que é natural compartimentalizar e classificar tudo, é a forma da mente humana de processar. A questão é que as pessoas simplificam demais e querem reduzir as coisas ao "mínimo denominador bunda comum", que é aquilo que é mais fácil de processar. Seja tv, cinema, música, as pessoas acabam querendo aquilo que não faz pensar, que é familiar, que é bobão e quem tem o Celso Portiolli na piscina de amido.
ResponderExcluir(Ainda que eu gostasse pra caramba de ver aquele programa "Xaveco", mas aquilo passava no sábado, portanto é outra história)
Sei lá, Zé. Curto muito anões presos naquela piscina de amido. E Xaveco era divertido mesmo.
ResponderExcluirMito da Caverna... que no fim das contas de mito não tem nada.
ResponderExcluirP.S.: Xaveco não era nada comparado a Qual é a Música!
A maioria das pessoas só precisa de meia dúzia de crenças para ser (supostamente)feliz. E, a propósito, o blog que eu te falei: http://classemediawayoflife.blogspot.com/
ResponderExcluirTha.
Incrível como os pensamentos fúteis são tão poderosos, tão capazes de desviar nossas atenções, nos tornando involuntários, inconscientes.
ResponderExcluir