quinta-feira, 15 de abril de 2010

A arte de caber


Para eles a vida é a arte de caber. Caber no nome, no terno, na agenda, em vinte e quatro horas. Pegar um rio pelo pescoço, torcê-lo qual cobra verde, dar-lhe oito nós, e guardar no bolso. Pegar o céu inteiro e amassá-lo como papel de carta, ou enquadrá-lo para que caiba no chaveiro. E se sobrar tamanho, ou planos e gordura, a vida também é a lição de se reduzir. Uma lição que se toma em goles curtos, um por dia, como uma alice paciente, e sem ter fim, como o cálice de Jotunheim. Reduzir até caber: aparar os pêlos, lixar a pele, apontar os dedos, cortar a carne onde ela exceda. E depois do tamanho justo, achar uma caixa para se guardar. Para eles a vida é a busca eterna por caixas. E eles sonham toda noite com caixas, e pensam constantemente em caixas: caixas com rodas, caixas com dois andares e piscina, caixas que geram imagens, caixas de banco, e as mais sutis; nomes, marcas, títulos, classes, tudo que empacota e os torna contáveis. A arte de caber exige ossos maleáveis ou cartilagem, até que, finalmente, todos eles estejam reduzidos ao que só cabe na caixa derradeira; aquela longa, triste, de madeira.

6 comentários:

  1. Cara, eu vi ontem mesmo um episódio de Lost com um longo monólogo sobre caixas.

    Eu sei, eu sei, meus comentários voltaram a não ter sentido...

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  2. Já assistiu "A partida", japonês?

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  3. Zé, outro dia escrevi em meu blog algo sobre espaços apertados. Nessa mesma conotação das caixas que vc descreve aqui. Se antes tivesse visto esse texto, o teria reproduzido por lá. Com aspas e crédito, infelizmente.

    Preciso de um livro seu. Como faz?

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  4. Derepente todo mundo lembra de todas as coisas a ver com caixas que viram nos ultimo tempos. '-'
    Lembra do comercial da caixa? *-*
    com a musiquinha "vem pra caixa vc também! :D"
    Taa,momento tenso; mudando de assunto,adorei seu texto.

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pode falar, eu não estou ouvindo