Seus olhos adestrados viram a estrutura onde eu só enxerguei a pele. Uma armação de papel e desejo, leve como as idéias mas firme como as convicções - a estrutura se desdobrava ante a sua percepção. Mas,para mim, não passava de corpos e diálogos, e direitos e cenários e política. Olhávamos ambos para a mesma cidade aos nossos pés. Do mesmo ponto alto que estávamos, eu do alto da minha soberba e você do alto da sua sabedoria.
Eu enxergava os carros e suas marcas, os novos e os velhos. Enxergava as moças nos outdoors, e as moças nas ruas, com as pernas de fora. Avistava os ternos dos homens e suas profissões, suas carteiras de identidade, seus relógios. Eu percebia bem onde começava o engarrafamento e terminava o horário comercial, os placares dos jogos de futebol, e os próximos capítulos da novela. Tudo me encantava, tudo me excitava. Os seios da atriz pornô expostos na banca de revista, sobre a cabeça das freiras que esperavam pelo ônibus. Os crucifixos nos colégios e o discurso pelo meio ambiente me emocionavam. Eu via os homens maus e os homens bons. Via as classes sociais em pugna eterna, aqueles que exploravam e os que eram explorados. Via os mendigos nas esquinas e os manequins nas lojas. Os biquínis nos desfiles, as bandas nos festivais.
Mas você não. Você enxergava nos carros a vaidade e a pressa, a insegurança e o desejo. Enxergava nos outdoors os pensamentos de massa, a ilusão, e nas ruas, passando de lá para cá, com suas pernas a mostra, você enxergava a esperança. Avistava as almas por baixo dos ternos, as mãos atrás dos relógios, o esforço por trás das carteiras. Percebia bem a vulnerabilidade em cada engarrafamento, e o artifício dentro das lojas. Percebia a fuga dos jogos de futebol e a libido das novelas. Tudo te assustava e te encantava. A cegueira das freiras, a velhice da jovem nua na capa da revista, o coração pequeno atrás dos seios. O peso impossível dos crucifixos arrastados pelo chão, a falta de norte dos que falavam pela massa. Você via o Bem e o Mal nos homens. Via as mesmas pessoas em classes sociais distintas, via os mesmos motivos entre os que exploravam e os que eram explorados. A mesma preguiça nos mendigos e nos manequins – a mesma miséria. As mesmas imagens em biquínis e nos festivais.
E a tudo você chamou de mundo e me perguntou: você conhece o mundo? Ao que eu respondi, prontamente: conheço. Assim, apontei para a pele de todas as coisas e chamei de universo, e aos vultos chamei de seres humanos. Mas você nada disse. Seus olhos haviam sido fisgados por um grupo de crianças que saíam da escola em algazarra. E neles, você vislumbrou a máquina do universo.
Eu enxergava os carros e suas marcas, os novos e os velhos. Enxergava as moças nos outdoors, e as moças nas ruas, com as pernas de fora. Avistava os ternos dos homens e suas profissões, suas carteiras de identidade, seus relógios. Eu percebia bem onde começava o engarrafamento e terminava o horário comercial, os placares dos jogos de futebol, e os próximos capítulos da novela. Tudo me encantava, tudo me excitava. Os seios da atriz pornô expostos na banca de revista, sobre a cabeça das freiras que esperavam pelo ônibus. Os crucifixos nos colégios e o discurso pelo meio ambiente me emocionavam. Eu via os homens maus e os homens bons. Via as classes sociais em pugna eterna, aqueles que exploravam e os que eram explorados. Via os mendigos nas esquinas e os manequins nas lojas. Os biquínis nos desfiles, as bandas nos festivais.
Mas você não. Você enxergava nos carros a vaidade e a pressa, a insegurança e o desejo. Enxergava nos outdoors os pensamentos de massa, a ilusão, e nas ruas, passando de lá para cá, com suas pernas a mostra, você enxergava a esperança. Avistava as almas por baixo dos ternos, as mãos atrás dos relógios, o esforço por trás das carteiras. Percebia bem a vulnerabilidade em cada engarrafamento, e o artifício dentro das lojas. Percebia a fuga dos jogos de futebol e a libido das novelas. Tudo te assustava e te encantava. A cegueira das freiras, a velhice da jovem nua na capa da revista, o coração pequeno atrás dos seios. O peso impossível dos crucifixos arrastados pelo chão, a falta de norte dos que falavam pela massa. Você via o Bem e o Mal nos homens. Via as mesmas pessoas em classes sociais distintas, via os mesmos motivos entre os que exploravam e os que eram explorados. A mesma preguiça nos mendigos e nos manequins – a mesma miséria. As mesmas imagens em biquínis e nos festivais.
E a tudo você chamou de mundo e me perguntou: você conhece o mundo? Ao que eu respondi, prontamente: conheço. Assim, apontei para a pele de todas as coisas e chamei de universo, e aos vultos chamei de seres humanos. Mas você nada disse. Seus olhos haviam sido fisgados por um grupo de crianças que saíam da escola em algazarra. E neles, você vislumbrou a máquina do universo.
"você conhece o mundo?"
ResponderExcluircomo podemos conhecer o mundo sem antes decifrar o enigma que é nos conhecer?
Bonito é apelido. Poético e perspicaz é pleonasmo.
ResponderExcluirMas meu lado feminista só quer saber porque as mulheres do seu texto são reduzidas a pernas, seios e hábitos de freira, Seu José!! Huahuhaua!
Blog novo, linkado! Novo pra mim, pelomenos!!
Beijos!
Belo texto!
ResponderExcluirEu sei que vc não vai gostar desse comentário, mas... vc me conhece, então é isso mesmo.
Mas é verdade, adorei o texto.