quinta-feira, 1 de abril de 2010

Farra do boi


Eu talvez ande reclamando muito, mas não é possível! Sério, não é possível. Ontem, no caminho para o trabalho, tive que esperar uma hora marcada em relógio pelo ônibus. Fiquei das 13:20 até as 14:20 esperando o Campus Marista. Quando ele finalmente chegou, cheio, o motorista nos levou a 20 km/h por que estava de papo com uma passageira, sentada embaixo da placa “Fale com o motorista somente o necessário”. No meio do caminho, a chuva. Um temporal sem tamanho castigou a cidade por pelo menos 3 horas. O ponto em que eu deveria descer estava alagado. Ondas de água suja cobriam metade da avenida 87. Detalhe: o mesmo ponto onde eu fiquei ilhado há um ano atrás. Passou um ano e tudo permanece igual. Ninguém teve a brilhante idéia de furar uma boca de lobo ali. Tive que descer e me esconder por duas horas numa loja de esquadrias. E de lá vi o espetáculo: filas de carros buzinando, passando na contra-mão, sacos de lixo levados pela enxurrada, motoqueiros xingando as camionetes, camionetes subindo no meio-fio, a rua se alagando, carrões passando em alta velocidade e molhando os pedestres. Olha, eu sempre me orgulhei e falei de pulmão cheio que prefiro o ônibus ao carro. Tenho carro disponível e uso ônibus, por que não acho justo contribuir com o caos do trânsito. Mas de uns tempos para cá, a briga está ficando difícil. O transporte público se deteriora e eu não quero mais chegar no trabalho com o tênis e as meias encharcadas por que meu ponto de ônibus virou as Fossas Marianas.

Então hoje, já seco e seguro, sento na minha sala, abro o jornal e leio: Vendas de veículos novos devem bater recorde mensal no Estado. Matéria do O Popular, do dia 31 de março, podem procurar. Em tom de comemoração, a reportagem relata que a redução do IPI está incentivando o consumidor a comprar mais, e isso “pode ser responsável pela marca histórica de mais de 11 mil veículos vendidos em apenas um mês”. Onze mil veículos em um mês! Para enfiar onde? No rabo de quem? E o povo comemora? Só pode ser brincadeira. Cara, isso me tira do sério. Ao mesmo tempo em que, nas matérias da sessão Cidades, os jornais noticiam os problemas de trânsito, os acidentes e a dificuldade de resolvê-los, nas matérias da sessão Economia, festejam a redução de IPI, os recordes de consumo e a abertura de novas concessionárias. E nas propagandas que entrecortam as matérias: promoções de concessionárias, camionetes, carros enormes a preços acessíveis. Qual o problema dessa gente? Será que não percebem a relação obvia e descarada entre tudo isso? Até quando vão continuar nessa farra do boi? Até quando os jornais vão estampar de um lado fotos de consumidores e gerentes sorridentes, felizes com o sonho do carro novo realizado, e de outro fotos de veículos estraçalhados no trânsito, de engarrafamentos infernais e de greves pelo transporte público? É inconsciência demais para uma vida só... E vamos, como sempre, remediar ao invés de prevenir; deixar rolar até que seja preciso resolver o imbróglio. Até que a situação se torne insustentável; e então, todos posarão de vítimas e de sofredores. Todos entrarão na fila dos injustiçados.Cara, que raiva.

5 comentários:

  1. Cara, você acabou de sair do meu Top 5 de pessoas que eu não imaginaria que mandariam alguém enfiar um carro no rabo. Sinta-se orgulhoso!

    (aqui no Rio o trânsito tem essa vibe "Bombaim em dia de chuva torrencial" quase o tempo todo)

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  2. É, Zé. Não tá fácil mesmo não. O pior de tudo é que fica dificil não querer um carro quando os ônibus que deveriam passar de 20 em 20 minutos passam a cada 1 hora. Essa cidade ainda vai explodir.

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  3. Eu passei por esse ponto da 87 no dia dessa chuva e tive esses mesmos pensamentos, com exceção do jornal (porque já não os leio) de indignação!

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  4. Mas é claro que as pessoas vão posar de vitimas,é sempre assim. '-'

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  5. Zé...tirando a burrice do mundo, escreve pra mim sobre a maudade. Escreve sobre como as pessoas nos machucam e nos decepcionam msmo quando estamos dispostos a não ver o errado. Descreve o que fazem com os que tentam ser bons, e como judiam dos honestos e decentes.Escreve pra mim sobre como a guerra acaba, com os maus rindo de dentro do buraco e os bons chorando, de cima, tentando entender no que foi que erraram. Descreve essa dor que ela dói apertado.

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pode falar, eu não estou ouvindo