terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Nostradamus futebol clube



Tanto a cultura greco-romana quanto a judaico-cristã, que foram as nossas mães culturais, adoravam a idéia de prever o futuro. Os gregos construíram seus oráculos, e muitos de seus mitos tinham por base a luta contra um destino revelado e inalterável: Cronos, Édipo, Aquiles, nenhum herói grego saía de casa sem a previsãozinha nossa de cada dia.

Enquanto isso, no deserto do Velho Testamento, profetas barbudos anunciavam a vinda do messias ou o fim do mundo, a depender do gosto do freguês. Os livros sagrados estão repletos de profecias, versões religiosas das previsões do futuro. O exemplo mais famoso é o Apocalipse de João, que tanto eu quanto Nostradamus concordaríamos como sendo o momento mais psicodélico Pink Floyd dos últimos dois mil anos.

Hoje, quem prevê nosso futuro são as propagandas de gadgets e os jornalistas super antenadinhos. E claro, o cinema. Temos a turma que acha que o futuro será uma festa, e que Jesus voltará com 2 milimetros de espessura e tela touch screen total;  e temos a turma do fim do mundo, do amanhã cinzento dominado por robôs psicóticos.

Mas o curioso é que a ligação, agora óbvia, entre futuro e  tecnologia não parece ter sido sempre assim tão evidente. O porvir previsto por gregos e judeus era muito parecido com suas próprias épocas: tinha cavalos, espadas e deuses flamejantes. É provável que, se perguntado sobre o futuro, um camponês medieval não pensaria em pessoas conectadas por máquinas ou telas finas e brilhantes, e não por incapacidade de imaginar tais coisas, mas porque para ele talvez não fizesse sentido a idéia de um futuro tecnicamente mais desenvolvido que o presente.

Foi a ciência e a ficção científica que nos inculcaram a projeção desse desenvolvimento linear e crescente. E a lei de mercado incluiu na equação a nossa necessidade de sempre ter algo melhor, mais rápido, menor, etc. O que me faz pensar em como a nossa visão de futuro está ligada aos conceitos presentes, ao que vivemos e desejamos agora. 

O cinema nos mostra isso com muita clareza: criamos mundos tecnicamente avançados e socialmente retrógrados.  Imaginamos pessoas que cruzam o espaço, que não têm doenças, mas que vivem sob ditaduras réplicas do império romano, e ainda resolvem seus problemas na base da porrada, com a diferença de que os sabres são de luz.

Ou seja, o futuro previsto é um reflexo dos problemas e questões do nosso presente e dificilmente foge disso. É muito mais fácil imaginar como serão os carros do futuro do que como serão os pensamentos e os desejos, porque vivemos num mundo totalmente absorvido por carros e completamente ignorante quanto aos pensamentos e desejos. 

4 comentários:

  1. Talves existam bons exemplos da chamada ficção cientifica leve que foque mais no desenvolvimento do ser do que no das máquinas, como 1084, Admiravel mundo novo, A Fundação, e alguns contos de Isaac Asimov, Philip K. Dick e etc, etc e mais etc, mas ninguém se importa muito.
    As pessoas gostam mais de falar de carros do que de comportamentos, de politica barata que de formas de relações humanas, o que reflete o gosto nos filmes e nas nossas previsões. Os judeus previam o messias e a terra santa, os maias se preocupavam com o fim das eras e revoluções celestes, nós nos importamos com tvs gigantes e carros que voam.

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  2. Não querendo ser pessimista Zé, mas acho que é mais fácil imaginar coisas que pensamentos porque as pessoas pensam cada vez menos.

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  3. Precisamos falar sobre isso pessoalmente.

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  4. Por ser o pensamento um produto do ato de pensar, torna-se tão complexo como o ato que o originou. Sendo assim,viver num mundo conteporâneo que nos fornece tudo mascado e digerido, pensar não é mais uma necessidade, mas uma afronta aos novos costumes. Então para quê correr o risco de sentir o seu cérebro escorrer pelo orifício de sua orelha porque você o usou muito? Se por um lado a tecnologia facilita nosso dia-a-dia, por outro, atrofia o cérebro dessa nova geração. E pelo andar da carruagem, será fácil imaginar não só como serão os carros no futuro, mas os pensamentos também, pois estes não existirão. Não é preciso pensar quando se tem ''alguém'' que faça isso por você.

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pode falar, eu não estou ouvindo